Dia desses eu estava num ambiente não muito costumeiro meu. Estava a trabalho, meio a contragosto, meio me divertindo, meio me incomodando, mas alerta por inteiro.
E eis que uma simples pergunta, gerou uma resposta fétida e expressivamente soberba. (a meu ver):
"- Quantos convidados terão a festa de casamento da sua filha, Dona Fulana?"
"- Ah, não sei, ando fazendo tanta coisa. Meu filho passou na facul...(pausa de 2 segundos) meu filho passou na Unicamp, e estamos mudando de apartamento... e não tive tempo pra sentar e definir isso".
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A questão aí não é somente a desconexão da resposta levando em consideração a pergunta, mas, o PORQUÊ dessa falta de sentido. Qual a necessidade de expor determinado acontecimento, quando este não se relaciona direta, nem indiretamente (de forma nenhuma!) com o assunto discutido?
Perceba que Dona Fulana esboçou nem comentar o nome da instituição em que o filho passara. Mas, não resistiu à mordida do bichinho do orgulho...Tinha que arranjar um meio de vomitar essa notícia fabulosa pra ela, mas completamente sem importância pra nós. Claro que né, mãe é sempre boba com essas coisas, aliás, pai e mãe, ficam por aí se gabando mesmo... Até aí tudo bem, mas a questão ainda não é essa.
Eu me referi a essa resposta como fétida, porque pra mim isso expressou a maior podridão desse universo: o orgulho e a soberba de todos nós nessa sociedade espetaculosa. Onde todo mundo quer se expor na Medina portando "ouro, ouro, muito ouro!"...
Dona Fulana estava num stand onde eu trabalhava, um evento específico onde a maioria do público consumidor era das classes A, B e C. Dona Fulana aparentava ser classe B, ou uma A decadente.. Falava num tom ríspido, como se todos a sua volta fossem serviçais a seu dispor. Tinha aquele olhar desprezível, que media a todos dos pés a cabeça... Tive a sorte (livramento do Senhor, rsrs) de não dirigir a palavra a tal criatura.
Me incomoda demais esse ar superior desnecessário, essa necessidade de mostrar que é melhor que todo o resto das pessoas (como se realmente fosse), essa falta de educação e respeito gritante, essa desumanização, esse modo meio infantil de se expor, de se relacionar..(Vamos mostrar aos coleguinhas na hora do recreio que o nosso caminhão de plástico é o maior que o deles).
Eu definitivamente não suporto.. Esses abraços falsos, esses dois beijinhos que nem encostam na bochecha, esse comentar do cabelo alheio, esses trejeitos engomados, essa fala vazia, essas discussões sem sentido. Esse 'passar na Unicamp'...
Não conheço o filho de Dona Fulana, nem sei pra qual curso este passou.. Só sei que passar na Unicamp não deve ser nada fácil, mas partindo do pressuposto que Dona F. é da classe A decadente, conclui-se que teve/tem condições de manter seu maravilhoso filho em instituições de ensino de qualidade... E aí é que entra outra questão...
A questão 2 agora é a CAUSA, aliás, esse texto inteiro trata disso:
Ando meio pensativa esses dias, visto a alguns acontecimentos da minha vida, e de pessoas bem próximas a mim. Pensava sobre causa, razão, sentido, justificativa.. principalmente depois de uma aula fantástica que tive:
Será que esse garoto que passou na Unicamp fará um curso que realmente gosta, ou vai cursar algo que supra as necessidades de ostentação da família? E se ele fará um curso do qual se identifica, porque fazer esse tal curso? Pra quê? Será que o processo preparatório pra esse vestibular foi desenvolvido arduamente? Será que houve realmente esforço, dedicação? Motivação correta?
Eu hoje faço uma graduação que sempre sonhei na vida. Mas, antes eu não sabia que sonhava, é como aqueles sonhos que sabemos que tivemos durante a noite, mas não lembramos de nada. Era assim, eu não assumia que gostava do curso, da área, não assumia que sempre respirei aquilo. Eu simplesmente me enganava. E pra conseguir chegar a uma libertação onde eu assumisse meu caminho e meu desejo, foi uma tremenda revolução interna, uma guerra pessoal. Além de ter que vencer as circunstâncias desfavoráveis ao meu redor.
Eu nunca pensei, planejei, suei, chorei, me esforcei tanto na vida, como foi pra eu passar nesse vestibular e fazer a graduação que estou fazendo hoje. E eu não passei na Unicamp, não sou classe A decadente, mas, eu tenho uma razão bem definida pra tudo que faço hoje. Como nunca tive antes na vida.
Não desmerecendo a conquista do filho de Dona Fulana, já desmerecendo, na real: julgando sem nem conhecer, sobrepujando meu esforço em detrimento do esforço alheio, tomando como base de julgamento, a fala altiva de Dona F.. Sim, é isso que estou fazendo. Talvez se a mãe desse calouro "unicampesco" não se portasse daquela forma deprimente, eu não estaria aqui, escrevendo um texto gigante questionando a causa dele prestar esse vestibular.
Talvez... mas é provável que estaria aqui falando, expondo minhas ideias, dando recados indiretos a determinadas pessoas.. Não aos meus inimigos, que nem sei se tenho, fora os inimigos internos que não se constituem pessoas.. Mas recados aos amigos que precisam encontrar uma causa pra não desistir.
A causa supera a exposição, a ostentação. Motivação, combustível, conteúdo, norte sobressai sobre qualquer dificuldade.
O espetáculo dançante à lá Lady Gaga da sociedade atual só aparenta, simplesmente não tem sentido, é totalmente vazio. Que interessa se o calouro da Unicamp realmente existe? Dona Fulana já ostentou, já venceu, o maior e melhor brinquedo é o dela. Beijinhos em bochechas imaginárias foram dados, ela já se despediu. Mas a minha JUSTIFICATIVA continua comigo, e eu vou seguindo.
O julgamento é necessário, a justificativa também . O que mais se deseja agora é um motivo, uma causa, um incentivo. O que mais se precisa agora é entender, ou simplesmente não entender nada. Talvez a causa seja a própria justificativa, se é que me entende.
ResponderExcluirA causa é a justificativa... e sim, eu entendo :)
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